16 de jul. de 2008

O INGRATO E A MOTOCICLISTA

ILUSTRAÇÃO: A motociclista - Site Google

Pois é meu caro, sempre quis lhe dizer isso, mas só agora eu digo.
Como você era chato! Santo Deus, e como sugava as nossas energias, nem lhe conto!
Mas de que adiantaria se eu lhe revelasse tais verdades, talvez piorasse.
O seu "bom dia" seco e sempre coroado por uma queixa e um pedido, ou melhor, uma ordem. Confesso que era difícil lhe dizer um "não".
Labutamos, ficamos horas e horas em infinitas discussões para tentar descobrir uma maneira de lhe colocar nos eixos, de consertar seus erros - aqueles dos quais, depois me contaram, você se gabava - e de lhe dar conforto mesmo que fosse da pior maneira possível.
Foi uma luta. Lembra daquele dia que me telefonou de madrugada queixando de sua dor de barriga e de seu cansaço. Levantei bufando e fui até você com a melhor das expressões, "pode deixar que eu resolvo". E resolvi.
Você também tinha um lado bom. Aquela música calma, o cheiro de incenso e loção mentolada, o sarcasmo e o humor negro ocasional.
Diverti-me muito quando soube que orientava as mentes alheias, logo você, um louco varrido.
A vida é assim, acabamos gostando dos mais improváveis. Hoje tenho certeza de que você nos queria muito bem, não sei o porquê, apenas sei e agora digo, talvez fôssemos improváveis também.
Pois bem, depois de tudo, tivemos a ilusão de que você fosse se endireitar. Achamos que com o presente que aquela garota motociclista lhe deu, tudo seria novo e diferente.
Mas não foi, a seqüência de erros continuou, e ganhamos de recompensa a sua ingratidão, o seu sumiço. Nunca mais o vi e tenho a impressão de que jamais o verei novamente.
Nadamos e morremos na beira da praia, que deve ser o lugar para onde você fugiu com quem lhe deu o presente.
Sentimos hoje muito a sua falta, guardamos no peito uma batida surda e frustrada, e naquele canto escuro e deserto deixamos verter uma lágrima densa.
Vai ver foi melhor assim, talvez não tivesse jeito mesmo, você ainda continua um chato em outras bandas.
Para você foi melhor assim!

3 de jul. de 2008

PRA NÃO DIZEREM QUE NUNCA FALEI DE AMOR

Foto: Fogão a lenha - Site Google

Existe definição para o que é o amor?
Varia de pessoa para pessoa ou os velhos clichês são a verdade?
"Amar é" respeitar, ser sincero, tolerar diferenças.
Mas isso ocorre quando não se ama também! É confuso.
...
Pra amar é preciso sofrer? Então desisto, a vida cumpre esta função.
É algo tão fortemente bom, que é impossível sofrer? Melhor assim.
Mas se assim o for, nunca amei então ora!
Não lembro de já ter me sentido tão fortemente bem.
...
O amor acaba? É infinito ou só quando dura mesmo?
Só se ama uma vez e o resto é diversão, é paixão.
Ou solidão. Macabra condição.
Ou talvez nem tanto, se amar bem, senão amém.
...
Amar pai e mãe, irmãos, amigos. Isso é fácil.
Ou não. Talvez este amor acabe um dia mesmo.
Construir amor, amor a primeira vista, reamar.
Amar sem ser amado. Mais estudos precisam ser feitos.
...
Quando amamos usamos diminutivos e infantilizamos a voz?
Tornamo-nos atraentes quando somos idiotas e frágeis.
Qual o motivo dos apelidos carinhosos?
O nome da pessoa amada é irritante ou é vontade de se sentir único?
...
Tantas perguntas e respostas vagas.
O amor é incognição, é indefinição, é variável.
Igual barata, adapta-se até ao gelo.
Igual fogo, se não houver o combustível, apaga.
...
Descobri. Amor é manutenção!

2 de jul. de 2008

RELEMBRANÇAS

FOTO: Site Google

Enquanto segue, ele relembra os velhos tropeços, as agruras e as manhãs de gosto amargo, companheiras de outrora que voltaram à tona.
O pobre diabo descobriu - ou apenas relembrou - que esta é a sua essência. O veneno de sua alma, antes latente, agora lança sua toxicidade como nos velhos tempos.
É quase agosto.
Ah tardes frias, ocasos rosados e dias intermináveis! Madrugadas insones, excessos e fúria, calmarias mascaradas pela ressaca das marés.
Tantos e tão só. Velhos e tão distantes. Saudoso, nostálgico e melancólico. A inspiração desaparece no horizonte reto, agora escuro. O que há de novo é o antigo remixado, as frases de sempre e as encardidas sílabas agora invertidas.
Ordinário silêncio que lhe dói o peito. Felicidades efêmeras que, de tão curtas, não lhe causam sequer um esboço de sorriso de canto de boca. Ninguém sabe o que ele quer, dizem ser ingrato, dizem ser confuso, dizem ser apenas o cansaço.
Segue só, na companhia da solidão. Pensa em nada, pensa em tudo, esquece do presente e revive o passado. Futuros do pretérito.
Desconsiderado. Relembra que escrever lhe ameniza a dor de não se sabe o quê. A dor que não dói.
Mágoas em álcool, calmantes, dias cinzentos...refugiado em uma casca frágil.
Ele navega a deriva, num mar de águas profundas, longe da terra firme. Continuam os desejos e as ilusões.
São novos dias, velhos novos dias com as relembranças de um passado ainda presente.